Após algumas horas de viagem, do Vale do Paraíba à Serra da Mantiqueira, chegamos em São Tomé das Letras. Pensávamos que seria um daqueles fins de semana comuns, em que poderíamos aproveitar a belíssima cidade, a estonteante natureza e, por que não, tentar até ver discos voadores. Mas os sinais na estrada já anunciavam algo fora da ordem. A pacata São Tomé, debruçada nos penhascos, estava tomada. Quase não havia espaço livre em suas ruas empedradas, restaurantes, acampamentos. Assim como outros milhares de pessoas, a única saída foi encontrar um cantinho vazio entre a multidão de barracas apostas na entrada da cidade. Tinha tráfego para se chegar às cachoeiras e, para nosso espanto maior, fila na pirâmide. Os ovnis não vieram, devem ter se assustado com tanta gente. Era um vai-vem atordoante de pessoas ansiosas pelo que haveria de tomar o brilho da própria cidade. Zé Ramalho estava a caminho para um concerto ao céu aberto. Com a falta de um camping apropriado, tivemos de nos virar para encontrarmos um lugar para nos banharmos. Foi até uma tarefa fácil. Entre uma andança e outra, ouvindo berros de Maria e ecos de Joana, constantemente vindos das grotas e vales nos arredores, conhecemos um casal local, que nos ofereceu o banheiro. Uma oferta aliviadora, já que o plano inicial era tomar banho na cachoeira mesmo. Coisas que só acontecem em Minas Gerais. Assim, fomos. Companhia agradável, banho tomado, expectativas acirradas, nos dirigimos para o show. Se a cidade não fosse de pedra, talvez até desabaria do penhasco que a sustenta. Muita gente. Muita gente doida. Loucas para idolatrarem o artista brasileiro que mais se identifica com a atmosfera local. Como durante o dia, não havia espaço. Alguns, mais exautados e destemidos, subiam nas árvores da praça para terem uma melhor visão. E aquela insanidade ecoou por toda a noite. Findado o concerto, voltava a sensação do formigueiro. Gente pra lá e pra cá, sem rumo, sem sentido, sem preocupação. No outro dia, São Tomé voltou a ser ela mesma, com suas casas de pedra, seus habitantes tranquilos e suas famosas letras.

Foto: Ursula Goulart Lima Rozon